Quando há obras, estas de reparação e conservação, o que uma casa contém é susceptível de ser visto de outros pontos de vista ou até de nenhum, em face da desarrumação que então se gera para que o trabalho de pedreiro, de trolha e, mais para o fim, de pintor possa avançar.
Na recolocação das coisas pode dar-se o caso de ter de se ponderar não tanto o que merece a pena conservar mas mais o modo como se hão-de guardar livros, se os há, álbuns, memórias que hão-de casar com o presente e esboçar futuro não premeditado.
Aqui não podemos ficar pela capa adivinhando o conteúdo, a substância porventura parecendo passar ao lado em face de vivências outras que o mundo e a vida foram impondo.
Acontece que a história não se nos oferece no modo linear. É assim que, de tempos a tempos, volta à liça este ou aquele assunto, esta e aquela ideia como que ressuscitando e fazendo de nós observadores daquilo que, tendo-se exprimido no seu tempo e a seu modo, pode agora, mais distanciadamente, constituir-se como uma espécie de motor de segunda ordem, não querendo isto significar que assim vê desde logo a sua importância diminuída mas antes dando conta de um outro plano que admita o modo vagaroso mas não desprovido de orientação e rumo, já que, em última análise, sempre se volta ao mesmo.
Este é, em certo sentido, o plano do interior, não diremos maltratado mas tão apenas, e de certo modo bem, arredado das magnas assembleias com ou sem direito a contraditório.
Quem viva o rigor do inverno e o pino do verão, sem por eles passar com demasiada pressa de chegar à meia estação, há-de poder reparar nos agentes do movimento. Debaixo do céu, nalgumas noites estrelado, além do alumiar do sol (sempre em brasa lá onde está) e da lua (fonte de mistério, ainda hoje), da ventania e das geadas brutais, chuva, granizo e nevoeiro, dia e noite, debaixo dessa abóbada, atravessando-a em todas as direcções, há o animal e só depois a planta e só depois a pedra, ou, como diria o nosso amigo asinino, primeiro a pedra, para que dela saia a água que ajuda a conservar para as precisões e com esta, logo de seguida, a vida desperte melhor. E também o fogo. E aquele modo ora temperado ora destemperado que, modulando vidas, faz as coisas acontecerem, por vezes com paciência ou jeito de burro, por que não?
O mundo, afinal, não é ocupado por inteiro pelos chamados, um tanto ambiguamente, espertos. Os burros sabem o caminho.
Este livro apresenta uma abordagem do asinino que, partindo do facto de se atribuírem a este animal, convencionalmente, serviços menores, muita teimosia e «burrice», desmonta esse ponto de vista com argumentos que procuram convencer o leitor a posicionar-se, na matéria em causa, de modo diferente. Inclui também dados estatísticos bastante exaustivos no que aos concelhos e povoações do distrito de Bragança diz respeito.
Carlos Sambade
Nota para esta edição
Escola Superior de Medicina Veterinária (cadeiras, cursos, clínicas)
Introdução
1.Distrito de Bragança
1.1 - Sua população asinina
1.2 - Considerações e história
1.3 - Classificação – Etologia
1.4 - Raça africana (E. asinus africanus)
1.5 - Raça europeia (E. asinus europoeus)
1.6 - Exploração e produção
1.7 - Reprodução – Criação – Higiene
1.8 - Alimentação e regime
1.9 - Melhoramento
1.9.1 - Alimentação
1.9.2 - Bebidas
1.9.3 - Estábulos
Conclusão
Bibliografia
Armando Aníbal Martins nasceu em 1899, em Castro Vicente, antiga vila e hoje aldeia pertencente ao concelho de Mogadouro e faleceu em 1973 em Vilar Chão, Alfândega da Fé. Formou-se em medicina veterinária e prestou serviço designadamente em Angola (cerca de dois anos), Lamego e Macedo de Cavaleiros. Casou em Vilar Chão e aí viveu uma boa parte da sua vida. É avô materno de Maria Júlia Martins Caldeira, que elabora os desenhos incluídos na presente edição da sua tese de fim de curso.