No seu texto deste livro, a psicóloga brasileira Jaqueline de Jesus observou que “A história da nossa ciência-profissão tem sido pautada por uma ânsia pelo controle, pela colonização dos corpos, pela patologização.” Se o anormal era para o pensamento religioso um pecado, para o Estado o pecado passou a crime. Numa fórmula breve, Jaqueline periodizou uma parte da história da psicologia assim: “Do pecado ao crime. Do crime à doença.” Na verdade, importa recordar um pouco a instrumentalidade política da psicologia na era da formação das disciplinas sociais estatalmente orientadas e da sua institucionalização académica: o século XIX europeu. Mas hoje os tempos parecem diferentes e a psicologia, no mundo dos seus muitos compartimentos - tal como mostra de forma detalhada neste livro a psicóloga portuguesa Fátima Rodrigues – parece ter-se tornado independente das determinações estatais e, de alguma forma, poderá ter cortado o cordão umbilical político. Psicologia que ajuda as pessoas a sofrerem menos e a encontrarem um sentido para a vida e para a identidade. Psicologia que aprendeu a caminhar pela diversidade das veredas culturais e pelas diferenças de imputação. Assim, referindo- -se ao que chamou psicologia africana, a psicóloga moçambicana Palmira dos Santos observou que “[…] uma depressão no Ocidente não deixa de ser uma depressão em África. No entanto, estar chorosa, sem vontade de sair da cama ou de cuidar dos filhos, rapidamente pode ser entendido como depressão no Ocidente enquanto que em África poderá ser entendido ou interpretado como algo mais transcultural como possessão, má vontade ou mesmo falta de educação.” Mas - para adaptar uma fórmula de Simone de Beauvoir – psicologia, ainda, que pode contribuir para transformar não apenas as mentalidades perturbadas, mas também as situações que as geram.
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